domingo, 30 de dezembro de 2012

Vivemos em uma Sociedade Ginecocrática?

Por Julius Evola


Muito tem sido escrito ultimamente na Itália sobre J.J. Bachofen, um pensador de Basel e contemporâneo de Nietzsche, cuja obra de gênio passou quase desapercebida durante sua vida, mas que é particularmente estudado hoje, especialmente na Alemanha. Bachofen devotou-se principalmente à exploração das civilizações antigas dos mundos clássico e mediterrâneo, especialmente em seus aspectos ético-religiosos, simbólicos e mitológicos, e sua ideia fundamental nessa área é de uma oposição original entre espiritualidade heroica, "solar", olímpica e viril, e espiritualidade "ctônica", "lunar", e feminina. Foi nessas linhas que ele interpretou as concepções religiosas, sistemas sociais, mitos, símbolos e formas político-legais das civilizações antigas, notando mais e mais o contraste e a interferência entre influências relacionadas a várias formas de espiritualidade que hoje podem facilmente serem referidas a distintos componentes raciais do mundo mediterrâneo arcaico: a civilização "solar" ou "urânica" obviamente associada às raças arianas, e a "ctônica" e feminina, associada, ao contrário, às raças pré-arianas ou anti-arianas.

As opiniões de Bachofen, ademais, não tem apenas um valor retrospectivo, elas usualmente oferecem importantes pontos de referência para compreender o significado mais profundo de alguns aspectos de nossa própria civilização moderna, através de impressionantes relações de análoga. É por isso que pensamos que pode não ser desprovido de interesse desenvolver algumas considerações sobre este tópico.

Em primeiro lugar, nós gostaríamos de nos deter na natureza e nos vários aspectos dessa civilização chamada por Bachofen de civilização da Mãe ou ginecocracia (de "gyne" e "krateia", quer dizer: governada pelas mulheres) e que, para nós, é identificada com a civilização anti-ariana e pré-ariana do mediterrâneo arcaico.

A primeira característica distintiva de tal civilização é o "telurismo" (de "tellus", que, bem como "chthonos" significa "terreno"). Essa civilização considera a lei da terra como sendo a lei suprema. A terra é a Mãe. Sob o aspecto da Mulher Divina, da Grande Mãe da Vida, ela incorpora o que é eterno e imutável. Ela permanece idêntica a si mesma e inexorável, enquanto tudo que ela produz tem um nascimento e um declínio, uma vida individual puramente finita e evanescente. Desprovido de qualquer virilidade espiritual e sobrenatural, tudo que é força e masculinidade então assume uma natureza obscura, selvagem, em verdade "ctônica" e "telúrica". E se "telúrico" geralmente nos faz pensar em fenômenos sísmicos, essa associação de ideias, em certa medida, faz sentido. Na visão do mundo em questão, a virilidade tem como seus protótipos divinos figuras como Poseidon, também chamado o "fazedor de terremotos", o deus do subterrâneo ctônico e das águas turbulentas, analogamente ligado pelos antigos a forças de passionalidade e instinto. Mais geralmente, a era ou civilização da Mãe é "telúrica", com referência a um sentido de destino, de necessidade, de evanescência fatal, de vida misturada com morte, fonte de impulsos selvagens e irrepreensíveis.

Para Bachofen, matriarquia, "ginecocracia", aquela de Deméter ou de Afrodite, esta na qual a Mãe Divina, diferentemente da antiga Deméter, tinha simultaneamente características sensuais, é a consequência social dessa visão central. Onde quer que o princípio supremo seja entendido como uma Grande Mãe (Magna Mater), a mulher terrena, que aparece como a encarnação mais próxima dela, vem a assumir naturalmente uma dignidade religiosa e a maior autoridade. É ela que essencialmente aparece como a doadora da vida, e, em relação a ela, o homem é apenas um instrumento. Sob seu aspecto maternal, ela então incorpora a lei, ela é a verdadeira base e o centro da família. Como amante, sob seu aspecto afrodítico, ela é então novamente a soberana do homem que é meramente escravo de seus sentidos e da sexualidade, meramente o ser "telúrico" que encontra seu descanso e seu êxtase apenas na mulher. Daí os vários tipos de mulheres da realiza asiática com características afrodíticas, acima de tudo nas antigas civilizações de linhagem semítica, e as rainhas-amantes de cujas mãos os homens recebem o poder e que se tornam o centro de um extremo refinamento da vida, um sinal de uma civilização essencialmente baseada no lado físico e sensual da existência. Mas onde quer que a mulher tenha características "demetéricas" mais que "afrodíticas" (a Deméter mítica possuía uma natureza majoritariamente casta e maternal), ela aparece também como uma Iniciadora no mundo antigo, como a que mantém e participa dos maiores mistérios. Em uma civilização na qual a virilidade significa apenas materialidade, a mulher, seja por causa do enigma da geração ou por causa de suas habilidades sutis de devoção e encanto, assume características religiosas, e ela se torna o ponto de referência de cultos e iniciações que prometem um contato com as Mães da Vida, com a espiritualidade cósmica, com o mistério do ventre da terra geradora.

Duas outras características do tipo de civilização em questão derivam disso, nomeadamente o elemento "dionisíaco" e o elemento "lunar". O mistério desses elementos, que podem ser mediados por uma mulher, não podem ser o mistério da espiritualidade olímpica, apolínea, solar, não pode ser aquele que está ligado à luminosidade viril e heroica da existência mortal, guiada pelo ideal de uma existência que, segundo o símbolo oferecido pelas naturezas solar e estelar do céu, é livre de qualquer mistura promíscua com a matéria e com o devir e é subsistiente e luz radiante por si própria.

Este, por contraste, era o ideal "urânico" (de "ouranos", "céu") que era específico ao outro tipo de espiritualidade. O mistério da Mãe ao invés leva a algo similar a uma dissolução panteística. É uma liberação disforme, alcançada, para não dizer arrebatada, em experiências desordenadas nas quais o elemento sensual e suprassensual misturam-se curiosamente e o lado "telúrico" se reafirma no sentido dominante de "orgia sagrada", na exaltação mística combinada com qualquer excesso e todos os tipos de manifestações selvagens. Tal era, em geral, o "dionisianismo".

É por isso que, no mito antigo, Dionísio é sempre significativamente acompanhado pelas Mães da Natureza, que assumem características majoritariamente "afrodíticas"; historicamente, também, seu culto era fortemente conectado com o sexo feminino e suas seguidores mais alegres e entusiasmadas eram mulheres.

Nessa conexão, a "lunaridade" já havia sido mencionada. A lua costumava ser chamada "terra celestial". Ela era assim entendida como uma sublimação do terreno, isto é do elemento ctônico. É luz, não como luz radiante, mas como luz refletida. É luz sem um centro próprio; seu centro, diferentemente do sol, está fora de si, ela é então luz "feminina" passiva - está intimamente conectada com a espiritualidade disforme dos êxtases e liberações que subjazem o signo da Mulher, enquanto, por outro lado, ela pode ser pensada como um contemplativismo, uma abstração ou um entendimento de leis abstratas, ao invés de um conhecimento "solar" essencial.
Agora, era uma característica das civilizações antigas da Mãe conferir à Lua uma preeminência sobre o Sol - nelas, a Lua às vezes até se torna masculina em gênero, o deus Lunus, seja para designar essa primazia ou para caracterizar o lado presumidamente negativo da virilidade. Mas o que também é específico à civilização que estamos analisando aqui é a idéia de uma primazia da Noite sobre o Dia, da Escuridão sobre a Luz. Escuridão e Noite são o elemento sagrado maternal, primordial e essencial: no mito, o Dia é produzido pela Noite, na qual ele se dissolve de novo.

Dois outros aspectos permanecem para serem considerados: a promiscuidade social, ou igualitarismo, e o "amazonismo". Bachofen, entre seus outros méritos, tem aquele de trazer à luz as origens "telúricas" e matriarcais da assim chamada doutrina do direito natural. A premissa original de tal doutrina é precisamente que todos os homens, como filhos da Mãe e seres também sujeitos à lei da terra, são iguais, de modo que qualquer desigualdade é uma "injustiça", um ultraje à lei da natureza. Daí a conexão que a antiguidade nos mostra entre o elemento plebeu e seus cultos maternos e ctônicos e o fato de que essas antigas festas orgiásticas e dionisíacas, que, junto com as mais extremas formas de licenciosidade e promiscuidade sexual, foram pretendidas para celebrar o retorno dos homens ao estado de natureza através da obliteração momentânea de qualquer diferença social e de qualquer hierarquia, eram centradas precisaente nas divindades femininas do ciclo "telúrico", mais ou menos diretamente derivadas do tipo da Grande Mãe da Vida. Quanto ao "amazonismo", Bachofen o via como uma variante de "gineocracia". Onde a mulher não consegue se afirmar através de seu elemento religioso materno ("demetérico"), ela tenta se afirmar vis-a-vis o homem através de uma falsificação das qualidades viris de poder e combatividade.

Tai são as características fundamentais da "Civilização da Mãe", característica, para assim dizer, do substrato pré-ariano do antigo mundo mediterrâneo. Ela foi derrotada pela Grécia Apolínea, Dórica e Olímpica; e então, e ainda mais completamente, pela Roma "solar", guardiã ciumenta do princípio do direito paternal e do ideal de espiritualidade viril. Porém, como as coisas são um processo de renovação constante, as variedades dessa cultura "telúrica" se manifestam novamente onde quer que um ciclo termine, onde quer que a tensão heroica e a vontade construtiva desaparecem e formas decadentes e degeneradas de vida e espiritualidade começam a reaparecer.

Agora, o que é notável aqui é a correspondência de muitos aspectos da civilização contemporânea à civilização da Mãe. Em suas manifestações externas, essa correspondência já foi notada. "Nas ruas de Berlim, Paris, ou Londres", como por exemplo, Alfred Baeumler, um famoso pensador nacional-socialista, escreveu, "tudo que você tem que fazer é observar por um momento um homem ou uma mulher para perceber que o culto de Afrodite é aquele diante do qual Zeus e Apolo tiveram que bater em retirada... A presente era porta, em verdade, todas as características de uma era ginecocrática. Em uma civilização tardia e decadente, novos templos de Ísis e Astarte, dessas deusas maternais asiáticas que eram celebradas em orgias e licenciosidade, em um afundar desesperado no prazer sensual, emergem. A fêmea fascinante é o ídolo de nossos tempos, e, com lábios pintados, ela caminha pelas ruas das cidades europeias como ela outrora caminhou por Babilônia. E como se ela quisesse confirmar a profunda intuição de Bachofen, a levemente trajada governadora do homem mantém na correia um cão, o antigo símbolo da promiscuidade sexual ilimitada e das forças infernais". Mas essas analogias podem ser ainda mais desenvolvidas.

Os tempos modernos são "telúricos", não apenas em seus aspectos mecanicistas e materialistas, mas também, e essencialmente, em diversos de seus aspectos "vitalistas", em suas várias religiões da Vida, do Irracional e do Devir, precisa antítese de qualquer concepção "clássica" e "olímpica" do mundo. Para Keyserling, muitas das correntes da assim chamada "revolução mundial" revelam uma natureza "telúrica" - ou seja irracional, principalmente associadas a formas de coragem, auto-sacrifício, fervor e dedicação sem referência transcendente. Em muitos casos, ele está certo.

Com o advento da democracia, com a proclamação dos "princípios imortais" e dos "direitos do homem e do cidadão" e o desenvolvimento subsequente dessas "conquistas" na Europa no marxismo e no comunismo, é exatamente o "direito natural", a lei niveladora e anti-aristocrática da Mãe, que o Ocidente resgatou, renunciando a qualquer valor "solar" e viril ariano e confirmando, com a onipotência tão comumente garantida ao elemento coletivista, a antiga irrelevância do indivíduo para a concepção "telúrica".

Dionísio reaparece com o romantismo moderno: nós temos aqui o mesmo amor pelo disforme, pelo confuso, pelo ilimitado, a mesma promiscuidade entre sensação e espírito, o mesmo antagonismo frente ao ideal viril e apolíneo de clareza, forma e limite. Pode a natureza "lunar" do tipo mais difundido de cultura moderna possivelmente ser posto em dúvida? Para fazer referência a uma cultura baseada em um intelectualismo pálido e vazio, uma cultura estéril separada da vida, capaz apenas de criticismo, especulação abstrata e "criatividade" vã: cultura que levou o refinamento material ao extremo e na qual a mulher e a sensualidade muitas vezes se tornam motivos predominantes a um nível quase patológico e obsessivo.

E onde quer que a mulher não se torne o novo ídolo das massas sob as formas modernas da "estrela de cinema" e de similares aparições afrodíticas, ela normalmente afirma sua primazia em novas formas "amazônicas". Assim nós vemos o novo tipo da mulher esportista masculinizada, da garçonne, da mulher que se devota ao desenvolvimento insano de seu próprio corpo, que trai sua verdadeira missão, que se torna emancipada e independente ao ponto de ser capaz de escolher os homens que ela quer ter e usá-los. E isto não é tudo.

Na civilização anglo-saxã, e particularmente na América, o homem que esgota sua vida e tempo nos negócios e na busca por riqueza, uma riqueza que, em grande medida, serve apenas para pagar pela luxúria, caprichos, vícios, e refinamentos femininos, concedeu à mulher o privilégio e até mesmo o monopólio de lidar com coisas "espirituais". E é precisamente nessa civilização que nós vemos uma proliferação de seitas "espiritualistas", espíritas, místicas, nas quais a predominância do elemento feminino já é significativo por si mesmo (a principal, a seita teosófica, foi totalmente e simplesmente criada e comandada por mulheres, Blavatsky, Besant e, finalmente, Bailey). Mas é por uma razão muito mais importante que o novo espiritualismo nos aparece como uma forma de reencarnação dos antigos mistérios femininos: é o escapismo disforme em experiências suprassensuais confusas, a promiscuidade da mediunidade e do espiritualismo, a evocação inconsciente de influências verdadeiramente "infernais" e a ênfase posta em doutrinas como a reencarnação, que confirmam, nessas correntes pseudo-espirituais, a correspondência que nós já mencionamos e provam que, nesses desejos desviados de ir para além do "materialismo", o mundo moderno não conseguiu encontrar nada que o conecte com as tradições superiores, olímpicas e solares da espiritualidade ariana.

Não confirma a psicanálise, com a proeminência que ela dá ao inconsciente sobre a consciência, à "noite", ao subterrâneo, ao atávico, ao instintivo, ao lado sensual do ser humano sobre tudo que é vida, vontade e verdadeira personalidade, novamente a antiga doutrina da primazia da Noite sobre o Dia, do maternal, da Escuridão sobre as formas, supostamente evanescentes e irrelevantes, que emergem dela para a luz? 

Deve ser reconhecido que estas analogias, longe de serem extravagantes ou arbitrárias, são baseadas em fundamentos que são amplos e substanciais e portanto gravemente perturbadores, já que uma nova "Era das Mães" pode ser o sinal do fim de um ciclo. Isso não é, obviamente, o mundo ao qual nós pertencemos e que está em harmonia com as forças de nossa revolução restauradora. Porém, infiltrações e desvios podem ser notados mesmo onde eles seriam menos esperados. Na Alemanha, nós poderíamos mencionar Klages e Bergmann, pensadores que, apesar de arianos, ainda proclamam de um modo surpreendentemente extremo concepções ginecocráticas e "telúricas" de vida. Na Itália, nós mencionaremos apenas dois casos. Eis o que pode ser lido na página 185 de uma recém publicada "Inchiesta sulla Razza": "O maior avanço da humanidade na direção da perfeição é constituído pela mulher. A mulher realmente é a intérprete do reino dos espíritos puros. Ela é mais pura e mais perfeita que o homem. E o homem sente uma atração irresistível por ela, a mesma atração, porém conspícua que um ser menos puro sente pelo mais puro". Nas páginas 152-153 de outro livro, "Valori della Stirpe Italiana", outra camada de "ginecocracia" é acrescentada: "Ao redor da mulher, como da Santa Mãe, todo o paraíso gira. Ventre de incontáveis vidas, é da Mãe que nasce tudo que vive no mundo. Da Noite nasce a vida, da Mãe Terra tudo se difunde. Ela é o sacramento vivo, como o Pão implicitamente contém o Deus vivo. A mulher é então a guardiã e o símbolo da raça: seus efeitos podem ser vistos em todas as criaturas, mas é nela que sua substância fundamental é adorada".

O fato de que, na Itália, dentro do movimento restaurador romano e ariano, ideias desse tipo podem ser proclamadas, mesmo como expressões esporádicas, mostra em que medida a confusão de valores pode às vezes chegar. As antíteses definidas por Bachofen são de importância fundamental para uma orientação correta. Nós temos visto que as formas contidas na antiga civilização da Mãe poderia nos permitir a identificar com precisão tudo que é crepuscular no mundo moderno. Os valores e ideais da civilização solar, olímpica e viril podem inversamente nos dar, com bastante precisão, as diretrizes para uma verdadeira reconstrução europeia, sobre bases autenticamente arianas, romanas, e fascistas, um ponto ao qual nós teremos que retornar ocasionalmente. 

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